CUIDADO COM O RETORNO DA ESCOLA. VOCÊ PODE ESTAR SENDO OBSERVADO
Nas diversas mitologias do mundo, o que não faltam são histórias macabras. Túneis amaldiçoados, mansões mal assombradas, reis demoníacos e criaturas assustadoras são alguns desses elementos. Na Tailândia, uma monarquia da Ásia, lendas locais se unem com o budismo, a principal religião do país, e o que não falta são histórias. Baseado na lenda de um espírito canibal chamado Pop, temos o filme Quando a Morte Sussurra, de 2023. Seguindo de maneira estrita a cartilha do horror oriental tailandês, o filme é mais um arroz bem feito do que inovador, ao trazer uma história sem muito medo, embora com alguns sustos quando uma família passa a ser atormentada por uma entidade opressora. Na realidade, é uma viagem com ótimos efeitos práticos pelo interior da Tailândia, disponível na Netflix e sendo mais um representante do cinema de terror daquela região do mundo.
BONS EFEITOS PLÁSTICOS SÃO ESSENCIAIS MESMO NO BAIXO ORÇAMENTO:
Primeiramente, Quando a Morte Sussurra, ou Tee Yod em seu idioma nativo tem como principal aspecto positivo o bom uso de efeitos práticos em uma narrativa com gore. Claro que não se iguala a franquias como Jogos Mortais e filmes como O Mal que Nos Habita (2023), mas o sangue e órgãos por exemplo, são usados de forma bem eficiente e impactante. Aliás, todos estes momentos não são expositivos. Pelo contrário, ao aparecerem em tela, eles têm algum fundamento, que pode até ser questionável, mas são importantes para o andamento da narrativa de uma família perseguida por uma entidade sobrenatural. Essa parte prática é unificada com a boa fotografia e uma direção correta. No primeiro aspecto, se destaca tanto as aparições quanto os momentos noturnos, que são sombrios, mas é possível enxergar tudo que acontece.

Já a direção merece um contexto em separado quando se trata de Quando a Morte Sussurra. A cargo de Taweewat Wantha, é possível perceber semelhança com outro lançamento do cinema tailandês. Trata-se de Espíritos: A Morte Está ao Seu Lado (2004). É possível destacar os momentos em que haverá a presença do sobrenatural. Não há ângulos fechados ou holandeses, o que poderia causar certo desconforto para o espectador. Mas esse parece não ser o modo de filmagem do diretor, que acaba criando seus momentos de suspense com a escuridão. Também não há muito o que se falar da sonoplastia do longa metragem. Os grilos de uma noite fria dos arrozais da Tailândia criam uma atmosfera que não é acolhedora, mesmo sendo o local daquela gigantesca família nos anos de 1972, na Província de Kanchanaburi e que se enquadra como baseado em fatos.
HÁ UM CONFLITO EVIDENTE ENTRE A REAÇÃO DA FAMÍLIA E O SOBRENATURAL:
Agora, em termos de roteiro, temos um problema. Quando a Morte Sussurra tenta criar uma espécie de conflito familiar enquanto um dos filhos, a jovem Yam, vivida pela influencer Mim Rattanawadee Wongtong acaba sendo dominada por uma entidade que viu após o retorno da escola com suas irmãs. Há uma tentativa de emular o ceticismo do pai em não acreditar enquanto a mãe recai diretamente na religião. Da mesma forma, há uma relação conturbada com o irmão mais velho, o Yak de Nadech Kugimiya, que retorna dos tempos do exército. Infelizmente, a construção é bastante precária. Os personagens são até carismáticos, salvo a possuída, mas há uma perda no momento em que o longa tenta se vincular nessas duas pilastras. Algo que A Médium (2021) e Marcas da Maldição (2022) souberam fazer com mais cuidado em suas especificidades.

Assim, junte isso a uma grande exposição do roteiro ao ponto de aparecer certo personagem que conta em detalhes o que deve ter acontecido com a jovem Yam e temos um filme previsível até certo ponto. Em seu primeiro ato, o espectador é levado a questionar quem será a portadora do caos. Mas isso logo se resolve. A construção dos laços familiares é importante, e elas estão presentes apenas com esse intuito. Não é difícil perceber que ali existe de fato uma família rural da Tailândia. Praticamente, o primeiro ato segue essa premissa de imersão do espectador no cotidiano da família, justamente na criação de mais comoção quando do terceiro ato. É aqui que Quando a Morte Sussurra acaba impactando, ao estilo M. Night Shayamalan com um plot twist que não deixa de ser inteligente, e talvez o melhor momento dentro da película.
QUANDO A MORTE SUSSURRA É SEGUIDOR DA CARTILHA DO HORROR ORIENTAL:
Claro, Quando a Morte Sussurra passa anos luz longe de inventar qualquer roda. Mesmo que seja de madeira ou a do Samsara. E isso em todos os seus aspectos. Da direção até o roteiro. Em uma analogia precária, o filme pode ser considerado de baixo orçamento, tal como A Hora do Pesadelo (1984), clássico do vilão Freddy Krueger. Porém, naquilo que se preserva a construir, não há tantos percalços. Obviamente, o roteiro é seu maior problema uma vez que não sabe se decidir onde o foco da narrativa estará. Se na família em si, lidando com os problemas sobrenaturais ou na amostragem gratuita da entidade, como em O Grito (2020). Se essa história fosse melhor trabalhada, provavelmente Quando a Morte Sussurra ainda seria um filme de baixo orçamento, mas de médio porte no sentido de impacto com o público.

Dessa forma, e depois de muita carne seca, arroz temperado e feitiços de uma bruxa que realmente é assustadora, Quando a Morte Sussurra é um filme pipoca para o seu público. Daqueles que durante seus 121 minutos de duração consegue criar certa expectativa. Pode parecer longo, mas nisso a construção satisfaz justamente por não saber o foco na sua narrativa. Com ótimos efeitos práticos e uma direção correta para os padrões do horror, acrescida com uma fotografia neutra e uma sonoplastia que está presente para tentar criar algum medo, o filme não cria novos padrões. Nem mesmo nas atuações. Porém, com base de que se trata de um longa de baixo orçamento, e que mantém as escrituras do horror íntegras tal como o Tratado de Kadesh, Quando a Morte Sussurra acaba sendo uma suspense fantasmagórico sem tanto medo assim, mesmo se colocando como baseado em fatos.
Números
Quando a Morte Sussurra (2023)
Quando a Morte Sussurra jamais tenta reinventar a roda do cinema de horror oriental. Pelo contrário, acaba sendo um filme que remete a cartilha completa. Baseado em uma lenda do interior da Tailândia no qual se acredita ser um caso verídico, o filme se perde no roteiro, mas tem um ótimo uso de efeitos plásticos.
PRÓS
- O uso de efeitos plásticos especialmente nos momentos sanguinários é excelente e cria uma repulsa necessária na história.
- A direção não é criativa, mas consegue manter o foco em sua estrutura seguindo exatamente o padrão oriental de filmagem.
- O uso da sonoplastia é consistente e interessante, especialmente nas horas noturnas, assim como o silêncio.
- Fotografia coesa, sem muito a desequilibrar e sabendo exatamente como proceder em desfocar ou mostrar perfeitamente a criatura.
CONTRAS
- Os personagens são carismáticos, porém a possuída passa um certo desprestígio ao ser praticamente uma robô.
- O roteiro não sabe para onde se encaminha, entre a psicologia da família e o sobrenatural, mesmo com um ótimo terceiro ato.
- Não inventa em absolutamente nada. Tudo que já foi visto em filmes anteriores do cinema de horror tailandês, está presente neste.