Revisitando: Espíritos – A Morte Está Ao Seu Lado (2004)

CUIDADO COM O QUE VOCÊ FAZ COM OS OUTROS

Um passeio cheio de névoas, ao melhor estilo Sillent Hill pelo Sudeste Asiático. Essa pode ser a descrição sumária do cinema de horror oriental. Com uma cultura tão distinta do Ocidente, não basta a existência de demônios como Pazuzu ou Leviatã, é necessário que essas criaturas sejam integradas na cultura local. Assim como conceitos, como o Karma, visto no hinduísmo e no budismo, assim como a existência de algo após a morte. Seja para o bem ou para o mal. Essas portas podem ser abertas e inclusive vistas em fotografias, e seus pesadelos, inimagináveis. Então, Revisitando um Passado não muito distante, temos um filme que é o suprassumo de listas do horror tailandês. Pegue sua melhor câmera e faça exercícios regularmente na coluna pois a Bangkok de Espíritos: A Morte Está ao Seu Lado, lançado em 2004 lhe espera dentro de um DVD da Play Arte ou no Youtube.

Receba atualizações via e-mail 📩

Leave this field empty if you're human:

A SIMPLICIDADE É CAPAZ DE MOVER MONTANHAS E FANTASMAS:

Primeiramente, é bom dizer que Espíritos: A Morte Está ao Seu Lado, ou Shutter em seu singelo texto original tem como particularidade a simplicidade. Não há contorcionismo de criaturas com vários chifres, garras e tudo mais. Aqui, temos apenas a assombração mais tradicional, as de pessoas que passaram desta para o outro plano. Porém, essa passagem foi tortuosa e elas ainda mantém vínculos com o plano terreno. Se passando na capital da Tailândia, a cidade de Bangkok, Espíritos tem a direção de Parkpoom Wongpoom e de Banjong Pisanthanakun, sendo esse último responsável pelo longa A Médium (2021). Essa simplicidade rende um cuidado em equilibrar a tensão da narrativa, que começa até de maneira sorrateira, inclusive omitindo algumas informações. Em pouco tempo, o espectador se pergunta quais são as ligações entre todos os personagens, mas precisará esperar até o final.

Essa simplicidade vem de um roteiro e uma direção prazerosa que consegue destacar uma aura de que algo está muito errado na vida de um jovem fotógrafo. Assim, no primeiro aspecto, escrito pelos diretores e por Sopon Sukdapisit, Espíritos: A Morte Está ao Seu Lado é didático e ainda pincela momentos de drama e horror psicológico, que de fato se mescla com o horror sobrenatural do Sudeste da Ásia. A criação dos momentos de tensão exige tempo. Isso faz com que o longa se quebre. Claro que pode soar até de maneira negativa. Porém, é necessário que o mundo humano interaja para que tudo não fique exclusivo do lado dos espíritos. Já enquanto ao segundo ponto, o trabalho dos diretores em criar uma atmosfera assustadora é notável, utilizando ângulos de câmera e movimentos sutis que mantêm o espectador em suspense.

HÁ MUITO MAIS COISAS ESCONDIDAS DO QUE AS FOTOGRAFIAS MOSTRAM:

Neste drama sobrenatural, Espíritos: A Morte Está ao Seu Lado segue a vida de Thun, um fotógrafo, e de sua namorada Jane. Acontece que após um acidente, ele acaba sendo assombrado pelo espírito de uma mulher que passa a aparecer em toda a fotografia que ele tire. Não interessa onde. Mas ele já a conhecia de tempos passados. Além de uma reviravolta especial em seu terceiro ato, o roteiro deixa sempre latente os dois atos antecessores de que o fotógrafo esconde bem mais do que está revelando para a sua namorada. Esse sintoma também é elevado através da sonoplastia do filme. Cada som, desde os sussurros até os barulhos repentinos, é utilizado para aumentar a tensão e o medo. O uso eficaz do silêncio também contribui para momentos de suspense intensos, tornando as cenas das aparições ainda mais impactantes.

Durante seus 97 minutos de duração, Espíritos: A Morte Está ao Seu Lado balança entre os gêneros de drama e horror. Afinal, sua história não é apenas um ponto fora da curva para que a ação dos personagens se desenrole. Ela tem sentido, e tem sentimentos. Sua direção, competente e sem sombra de dúvida um padrão para o cinema tailandês também é auxiliado pela fotografia, que de maneira geral também se faz um dos melhores elementos do longa. Sendo um filme de 2004, a granulação parece ser usada com uma estética antiquada. Porém, consegue, junto de uma paleta de cores escuras reforçar o clima de mistério. O jogo de luz e sombras em apartamentos e outros locais fechados são usados habilmente para que a aparição fique à espreita, assim como o foco em efeitos práticos ao invés dos especiais.

SIMPLES, ESPÍRITOS SE TORNOU UM CHECKLIST DO BOM HORROR ORIENTAL:

Embora seja o ápice do horror tailandês sem dúvida, Espíritos: A Morte Está ao Seu Lado tem seu ritual fracassado de exorcismo na atuação dos protagonistas. Não que sejam terríveis, como por exemplo em filmes canastrões de zumbis, como Army of the Dead: Invasão em Las Vegas (2021). E segue em anos luz de bombas cinematográficas como Olhos Famintos: Renascimento (2022). Contudo, este acaba sendo um caso no qual o roteiro foi mais elevado que seus intérpretes, mesmo que esse se agarre a questões simples, como o passado e o karma daqueles que fizeram algo de errado. Ananda Everingham, como Thun, é até sólido, capturando as nuances de um homem atormentado por seu passado. Mas existem momentos em que dificilmente suas reações são naturais. Já Natthaweeranuch Thongmee, como Jane, complementa bem, e apenas isso.

No conto de todas as fotografias, Espíritos: A Morte Está ao Seu Lado acaba sendo um legado cult do terror sobrenatural. O filme apresenta um padrão de qualidade acima de seus antecessores, ao mesmo tempo que consegue alterar a roda do horror com um novo padrão. Aqui, não temos criaturas voando na tela a todo momento, como Annabelle 3: De Volta Para Casa (2019) e outros filmes de terror do Ocidente tem uma idolatria. A direção é calma, a fotografia rasteira e o roteiro simples, mas impactam quando todas essas funções se unem. Espíritos acaba sendo uma representação que não é necessária virar cambalhota para criar uma atmosfera de suspense. Basta uma história de um passado profano e do karma que suas ações atraem. Apenas faltou um pouco mais de fôlego. Mas no fim das contas, a fotografia deixada pelo filme é assustadora, e no bom sentido.