Jogos Mortais (ou Saw no idioma do Tio Sam) é uma franquia de filmes com mais vales do que picos. E vales profundos por assim dizer. Com exceção do primeiro e do segundo longa, a montanha russa dos acontecimentos do serial killer Jigsaw vira um carrinho desgovernado indo para o abismo da ruindade longe da qualidade de Ghostface. Não por menos, quanto mais aumentava os números após o título, pior ficavam as notas da crítica e do público. É nesse cenário de tentar trazer de volta para o caminho da Cidades das Esmeraldas do sucesso, que Jogos Mortais X chegou em 2023 não apagando, mas acrescentando elementos, criando um arroz com feijão clássico, com muita tortura digna da cabeça de John Kramer. Sente-se e escute aquela gravação poética em uma fita K-7 e absorva o que puder nessa Crítica do Guariento Portal de Jogos Mortais X (2023).
As armadilhas tem espaço para brilhar e são brutais! O filme traz brinquedinhos novos, onde irão render momentos de agonia e repulsa até mesmo àqueles com estômago de ferro, com uma sequência que possivelmente irá entrar no hall das mais memoráveis da saga […]. Com uma ambientação baseada nos primeiros filmes da franquia, o diretor Kevin Greutert consegue construir uma direção envolvente e usa bem a iluminação para criar uma atmosfera angustiante nesse novo filme. […] Compensando o tempo perdido com os últimos lançamentos, Jogos Mortais X chega de forma excelente ao universo tão reverenciado pelos fãs, com mais cenas violentas e macabras. Apesar de ter um roteiro com inconsistências, é notável que o longa consegue fazer jus ao legado de Jigsaw, sendo um dos melhores filmes da franquia.
Crítica de Jefferson Victor na Revista Fácil sobre Jogos Mortais X (Saw X). Nota: 8.5/10.0.
UM INÍCIO SÓBRIO, PARA UM ESCALONAMENTO VORAZ.
A primeira grande ideia de Jogos Mortais X é justamente se colocar cronologicamente entre o primeiro filme, de 2004, e o segundo, de 2005. Sendo assim, John Kramer (Tobin Bell), ainda está vivo e ele de fato é o personagem principal. Esta é a primeira discrepância, pois em suas outras aparições, embora proeminentes, toda a narrativa circulava nos personagens sequestrados. E Bell, na primeira parte do longa, sabe como cativar. Já é de conhecimento geral que John Kramer tem um câncer terminal no cérebro, e as expectativas estão ainda mais baixas do que a economia da Argentina. Contudo, um tratamento “milagroso” organizado no México é a porta de entrada para uma esperança que nosso mais querido serial killer gostaria de ter, para até quem sabe mudar de vida e trocar de profissão. É possível se afeiçoar ao mal velhinho nesses primeiros momentos.

Infelizmente, sabemos o destino de Kramer devido ao encaixe de Jogos Mortais X na história da franquia, e tudo não passa de desilusão. Roubado tanto fisicamente quanto psicologicamente, John Kramer é claro, vai atrás de todos os farsantes em busca de vingança. É é a partir desse ponto que temos o velho Jogos Mortais de volta. Armadilhas sádicas e mirabolantes que, com toda certeza levam a aflição do espectador até as alturas do Everest. Afinal, essa é a marca da franquia. E em Jogos Mortais X, tudo está nitidamente visível, sem aquele filtro patético verde ou azul dos outros filmes. Tudo é muito vívido, e o sofrimento dos personagens parece real. De início, é possível dar certa razão a Kramer, pois a raiva e a frustração conseguem ultrapassar o espaço tempo e chegar ao espectador.
VIVA OU MORRA, FAÇA A SUA ESCOLHA COM UM BOM ROTEIRO.
No entanto, a represa abre suas comportas quando a quantidade de tortura ultrapassa as barreiras das pessoas comuns. Criativas, as “missões” impostas por Jigsaw envolve desmembramento, mutilação, exposição a radiação e tudo que pode acabar com uma boa existência humana. Então, já é de bom tom avisar que Jogos Mortais X tem um começo sóbrio, mas se transforma no filme que os fãs da franquia sabem o que esperar. E aqueles que não suportam aflição devem ficar bem longe, como o diabo que foge da cruz. Essa divisão clara e evidente dos atos, criada pelo roteiro de Josh Stolberg e Pete Goldfinger, os responsáveis pelas histórias dos piores filmes da franquia, é uma luz no fim do túnel, e uma grata surpresa. Claro que ele possui imperfeições, mas de modo geral, sua construção é uma das mais sólidas da franquia.

Assim, junte essa coerência narrativa com boas atuações e uma direção satisfatória e temos um filme que se destaca na multidão e na desgraça que se tornou a franquia Jogos Mortais. No primeiro aspecto, Bell e seu Jigsaw estão mais velhos pois o tempo é implacável, mas isso não faz diferença. Seu rosto, que vai da emoção até a desolação, mostra que ele possui um coração em algum lugar. Já seus algozes inicias, esses são apresentados de maneira rápida, com exceção de Cecilia Pearson (Synnøve Macody Lund), a mente responsável por roubar os outros através de tratamentos fajutos e que nem mesmo acontecem. A personagem passa o filme inteiro sendo a criatura mais detestável e repugnante possível, o clássico antagonista supremo. Seus aliados capturados tem alguma camada, especialmente a jovem Gabriela (Renata Vaca) e sua “ligação” com a ajudante de Jigsaw, Amanda Young (Shawnee Smith).
DIREÇÃO COM OS MANEIRISMOS DE SEMPRE, PORÉM MAIS EFICIENTE.
Impossível não destacar os momentos de interação entre Kramer e Young em Jogos Mortais X. Mesmo que simples, mostram um elo entre o criador e sua pupila. Isso é uma deixa para o que ocorreria em Jogos Mortais 3 (2006). Quanto a direção de Kevin Greutert, temos uma melhoria considerável. Esqueça o filtro horroroso em tom azul ou verde. Assim como a escuridão eterna que parecia bloquear tudo como foi a Batalha de Winterfell em Game of Thrones (2011-2019). Sendo assim, tudo está bem a mostra para gerar a maior aflição possível, com o auxílio da fotografia de Nick Matthews. O local dos jogos inclusive é claustrofóbico na medida. Claro que os mesmos truques que já são comuns na franquia se mantém, como os cortes ultra rápidos e secos e claro, alguns flashbacks que explicam aos mais desatentos algum acontecimento anterior.

Mesmo com alguns acertos nesse bisturi cirúrgico, Jogos Mortais X não é aquela perfeição como as estátuas roubadas do Partenon no Museu Britânico. E isso praticamente se concentra no seu terceiro ato. Parecendo genial e vibrando na mesma energia de M. Night Shyamalam, há um plot twist onde as peças já eram colocadas no tabuleiro que pode pegar alguns. Porém, ele se torna sem sentido ao ser analisado friamente, ainda mais sabendo da mente maquiavélica e tão geniosa que é a de Jigsaw. Não há uso de música em Jogos Mortais X na maior parte de seu tempo, com exceção do tema da franquia em momentos chaves. O silêncio ou o rangir das ferramentas é o suficiente para a aflição, embora ele não seja tão bem utilizado quanto no filme que deu origem a todo esse mundo.
PARA A FRANQUIA JOGOS MORTAIS, É UM ÓTIMO RETORNO.
No fim das contas desta Crítica, depois de uma craniotomia e uma transfemoral, Jogos Mortais X tem aquele lampejo de inovação ao trazer um fundo mais emotivo da vida de John Kramer. E não partir diretamente para a mais absolutamente carnificina, com sangue escorrendo pela tela. Essa parte da personalidade de Jigsaw é interessante de observar, e justifica até certo ponto suas atrocidades com aquelas pessoas. A narrativa consegue ser bem amarrada e não é arrastada mesmo em seus 118 minutos de duração, muito bem diluídos por sinal. A boa produção, e a posição de Tobin Bell e seu personagem como principais conseguem levar o filme sem muitos percalços, o que inclui uma boa fotografia e uma direção que não é insuportável. Ela consegue fazer o clássico feijão com arroz com qualidade, sem inventar e errar.

Existem alguns tombos e maneirismos. Isso tanto para o bem quanto para o mal. O terceiro ato em especial, parece genial mas não é. E sem um derradeiro fim, deixado em aberto, mostra-se que a franquia pode ser expandida sem ter de mexer em tudo que já foi criado, com direito a cena pós-créditos. De toda forma, Jogos Mortais X é um retorno agradável em seus padrões para uma franquia que sofreu com péssimas histórias, uma direção horrível e atores que não deviam atuar. Claro que em termos de “diversão”, o espectador já deve estar ciente do que está procurando e não passar mal fácil. Em outras palavras, tortura, sangue e sofrimento, o que explica a classificação para maiores de 18 anos. Sabendo disso, Jogos Mortais X fica entre o primeiro e o segundo longa quando o quesito é ser bom naquilo que faz.
Números
Jogos Mortais X (2023)
Marcando o retorno e, pela primeira vez, o protagonismo em John Kramer, Jogos Mortais X (2023) é coerente naquilo que se propõe e possui um certo rigor estético que o coloca a cima de muitos de seus antecessores, com alguns poucos deslizes. Mas sem dúvida, é muito competente em sua proposta.
PRÓS
- Pela primeira vez em muito tempo, o enredo é razoavelmente amarrado e sem muitas inconsistências.
- A direção é satisfatória ao permitir que tudo seja visto, dando ênfase as armadilhas de Jigsaw.
- O protagonismo de John Kramer marca o longa com uma boa atuação, suportada pelos outros personagens.
- É interessante a criação de dois momentos no filme, um para apego do personagem e outro para o seu lado mais brutal, porém já conhecido.
- Mesmo com 118 minutos, a construção do filme, desde o local até os acontecimentos não transformam em algo chato.
CONTRAS
- O terceiro ato, em aberto, sucita mais dúvidas do que explicações em como se chegou até aquele ponto.
- O silêncio, os barulhos e a trilha sonora não são usados tão bem quanto em longas antecessores.
Eu colocaria esse filme como melhor que o segundo sem dúvida, por ser bem mais redondo em termos de história. Além disso, parece que aprenderam a filmar pois não é aquele desespero completo. Embora ainda exista cortes secos como vocês mencionam aqui. Mesmo assim, és uma boa reentrada dessa franquia, mesmo com o desgaste do tempo.
Olá Bruno, você já é nosso comentarista cativo, e pode continuar sendo. Então, você tem o pensamento de alguns outros críticos, eu também acho isso. Embora as vezes me bate uma certa dúvida. No geral, Jogos Mortais X é sim melhor que quase tudo que já apareceu nessa franquia.
Não tenhas dúvida. Ele é melhor do terceiro em diante com propriedade. Tem alguns inconsistências como tu disse, mas no geral, é um bom recomeço pra essa franquia. E tu sabes que já vão ter continuações (no plural mesmo) já que a luz verde foi acesa, e olha que nem foi o filtro deles.