Os anos 2000 deixaram um interessante legado, tanto no mundo dos games quanto dos filmes. Ridley Scott, de Alien (ou Alien, o 8º Passageiro), viria a dirigir Gladiator (Gladiador). Diablo II, da Blizzard Entertainment, e GTA San Andreas, da Rockstar Games chegavam as prateleiras arrebatando uma geração. Agora, a comédia, como gênero de filme, também recebeu boas representações. É o caso de Miss Congeniality, conhecida no Brasil como Miss Simpatia e lançado pela Warner Bros no ano 2000. O enredo é o mais previsível possível, porém a junção do Concurso Miss Estados Unidos, agentes do FBI e o carisma de Sandra Bullock, de Bird Box, uma das queridinhas dos estado-unidense e temos um filme chiclete com uma trilha sonora cativante nesta Crítica do Revisitando o Passado. Tenha bons modos e torça pela paz mundial embarcando em desfiles ao som de One in a Million aqui no Guariento Portal.
Mesmo que não atenda totalmente aos tópicos da pauta feminina contemporânea, Miss Simpatia, lançado em 2000, pode ser considerado um filme sobre empoderamento. Basta que não sejamos pessoas de comportamento totalizador. Diferente das comédias românticas da época, a produção investiu numa abordagem mais livre para a mulher que não precisa necessariamente ser salva por um homem no desfecho da história, algo que esteve no epicentro dramático de alguns filmes protagonizados por Sandra Bullock desde os anos 1990.
Leonardo Campos, do Plano Crítica sobre Miss Simpatia – Classificação: Ótimo.
Sem Sandra Bullock, Miss Simpatia seria sem simpatia alguma.
É impossível começar uma Crítica sobre Miss Simpatia sem falar de seu principal acerto; a escalação de Sandra Bullock na alçada de protagonista. Sim, ela é capaz de levar completamente o longa em suas costas, tal como Atlas carrega o mundo na Mitologia Grega. Para isso, a atriz e a equipe de direção conseguem trabalhar muito bem o antes e o depois que a agente Gracie Hart, uma agente do FBI se transforma em Gracie Lou Freebush, Miss New Jersey. Acontece que, devido a ameaças constantes de um desconhecido terrorista, o FBI deve se infiltrar no Concurso que escolherá a nova Miss Estados Unidos. Para isso, a escolhida, embora a muito contragosto, tenha sido a personagem de Bullock. Tanto é que nem seus próprios companheiros de trabalho – todos homens – desdenham dessa possibilidade dela se transformar no famoso perfil feminino que concorre em concursos de beleza.
Mais do que o Pomo de Ouro, o roteiro acerta na mudança de Bullock.
Essa demarcação é muito bem introduzida no primeiro ato, em que vemos um pouco da infância de Hart e de seu comportamento como uma policial. Em um ambiente atrelado pela masculinidade tóxica nível Chernobyl, a personagem de Bullock acaba trazendo trejeitos como beber, arrotar e se descuidar completamente de sua aparência. Para ela, concursos desse tipo são tão fúteis quanto as mulheres que participam, que apenas buscam a paz mundial e são completamente vazias de conteúdo. Claro que, durante a narrativa ela passa a mudar de opinião, uma vez que entra de cabeça neste mundo. A questão é que essa transformação, mesmo que bem demarcada, não é absurda. Gracie Hart continua sendo Gracie Hart, e isso é visto na apresentação de talentos, em que ela apresenta uma aula de golpes marciais. Tudo para que, no fim das contas, descubra-se quem quer levar aos ares a nova Miss Estados Unidos.
Sabemos da beleza de Sandra Bullock, mas em Miss Simpatia ela consegue passar essa ideia de transformação até mesmo física. Seja com o seu andar e dentro da competição. Sem sombra de dúvida, todas as piadas e gracinhas feitas pela atriz em seu papel consegue trazer com maestria a graça e a sensação de uma comédia descompromissada que Miss Simpatia possui. Aos poucos, o espectador também é levado para este mundo e passa a torcer pelas candidatas, até mesmo as mais vilanescas, como Mary Jo Wright, Miss Texas vivida por Deirdre Quinn. Vilanesca é claro, no sentido de buscar a todo o custo a coroa do concurso. Toda essa narrativa é bem apresentada quando se foca exatamente na performance de Sandra Bullock, assim como na direção de arte, fotografia e na trilha sonora. Essas três parcelas fazem de Miss Simpatia uma comédia deveras agradável, disso não há dúvida.
Se o roteiro é simples, a produção segue a risca essa cartilha.
A sonoplastia, apresentando sucessos e regravações como a já citada e explosiva no Tik Tok One in a Million, do cantor Bosson e do grupo sueco ABBA ajudam na sensação de que estamos assistindo de fato a um longa metragem divertido. Em se tratando de um concurso de beleza, é claro que as fases de tal concurso são também bem apresentadas, seja nas roupas de gala ou da famosa roupa de banho. Tudo que é possível ver em um Concurso estilo Miss Universo, que passa todo ano na TNT é possível ver as entrelinhas aqui. Dito tudo isso nesta Crítica, esse tripé consegue divertir o espectador, desde que ele tenha em mente não esperar algo tão grande assim, com algumas pitadas dos personagens secundários que se tornam importantes, como Victor Meeling, de Michael Cane, responsável por transformar Hart e Cheryl Frasier, Miss Rhode Island, interpretada por Heather Burns.
Outro ponto de destaque tal como a balança de libra é a direção de Donald Petriee em Miss Simpatia. De fato, sua equipe, especialmente a parte de fotografia consegue passar as devidas sensações e nuances de Bullock quando em foco. O próprio Petriee sabe como dirigir o filme sem muitos conflitos. Até pelo fato de que Miss Simpatia não é tão pretensioso como Inception (A Origem), de Christopher Nolan ou Gravity (Gravidade) de Alfonso Cuáron, que Bullock participaria tempos depois. Afinal, não usa planos holandeses ou planos sequências. Claro que isso não quer dizer falta de qualidade, mas apenas ter a noção do que a proposta do filme quer trazer ao seu público e saber usar de seus elementos. Claro que inventivo, pelo menos nesta parte Miss Simpatia não é, mas consegue trazer um bom feijão com arroz que é possível curtir em um final de semana.
Não é o Ragnarok, mas todo mundo sabe o final.
Entretanto, da mesma forma que o roteiro e a direção se segura tanto na atuação de Sandra Bullock, ele também peca por ser tão simples que facilmente qualquer espectador atento ao estilo de narrativa dos anos 2000 notará nos primeiros minutos o que ocorrerá no longa. Se, por um lado, há o acerto em que, mesmo em um mundo que foge da personalidade, Gracie Hart continua sendo ela mesma, a trama policial que cerca o concurso é apenas um fio de navalha condutor da narrativa. Algo que no fim das contas, poderia ser trocado por basicamente qualquer outra coisa, e não serve de aprofundamento de absolutamente ninguém. Essa narrativa, assinada pela trinca Marc Lawrence, Katie Ford e Caryn Lucas é didática até demais em mostrar o caminho de Dorothy até a Cidade das Esmeraldas por assim dizer, com placas para todo o canto sem mudança de percurso algum.
A narrativa pode até ter um revisionismo na comédia dos anos 2000 ao apresentar uma mulher durona. Já que o padrão da indústria naquele momento era que comédias apresentassem uma mocinha aparentemente indefesa e com pouca massa encefálica. Claro que Miss Simpatia não é isso, mas somente essa guinada em uma performance feminina não é o suficiente. Acaba que no fim das contas, o roteiro é bastante raso, conforme já destacado nesta Crítica. Algumas análises mais fortes podem até tentar contrapor, dizendo que Miss Simpatia jamais poderia ser classificado como um filme feminista. Afinal, segue as regras para a padronização da mulher. Longe desse Revisitando o Passado destacar isso para Miss Simpatia, já que com um roteiro tão simplório e um caminho das pedras tão óbvio, o subtexto para se criar esse argumento é nulo. É tentar encontrar uma agulha no palheiro sem necessidade.
Divertido? Sim. Desde que seja despretensioso com em A Múmia.
Entra então a grande questão desse Revisitando o Passado e dessa Crítica de Miss Simpatia. O filme é divertido? Sem sombra de dúvida, se atentando com as seguintes observações. Temos uma das mais interessantes atuações de Sandra Bullock, que já havia enveredado pelo lado da comédia, porém romântica, do complicado Practical Magic (ou Da Magia a Sedução). É por causa de sua atuação que o filme adquire suas melhores características. O divertido concurso de beleza mostra um outro lado além de pessoas que poderiam ser consideradas fúteis. É também uma forma de Hart se descobrir, sem perder a sua essência, assim como o espectador de viajar de gôndola nesse mundo, rindo por diversas vezes das piadas desnecessárias e da risada de porco, assim como da interação de Hart com outros personagens, especialmente o de Cane, seu tutor pior que o Severus Snape de Harry Potter em termos de aprendizagem.
Assim, junte tudo isso a uma boa estética e trilha sonora, e temos um filme com a cara dos anos 2000. Ainda assim, com as suas próprias dificuldades. Não espere que sua história seja inovadora. A trama policial que leva o FBI para dentro de um concurso de beleza não engaja. Pelo contrário, é um barquinho a vela que marca território. Não há muito de subtexto, por mais que se tente forçar algo. E nem também uma invenção de uma nova roda. Talvez apenas pela questão de se colocar agora uma mulher no grupo de personagens poderosos, que não precisam de uma mão amiga. Dito isso, Miss Simpatia é para aqueles que querem se desligar um pouco do mundo real na HBO. E com isso, curtir uma comédia com seus 110 minutos de duração, com muito glamour e pedidos de paz. Com certeza, elas não jogam Call of Duty.
Números
Miss Simpatia (2000).
Junte o Concurso Miss Estados Unidos, agentes do FBI que precisam evitar um atentado e a graça da presença de Sandra Bullock e temos uma comédia nada romântica, porém bem divertida dos anos 2000 chamada Miss Simpatia.
PRÓS
- Uma atuação maravilhosa de Sandra Bullock como protagonista que carrega o filme.
- Descompromissado, Miss Simpatia é uma grata surpresa em termos de comédia, sem muitas declives na narrativa.
- Trilha sonora e direção de arte até hoje são caprichadas.
- Divertido observar as nuances que a personagem apresenta, e seu crescimento dentro que era fútil.
CONTRAS
- Não é inventivo, mesmo que seja um dos primeiros a apresentar uma mulher durona de protaginista.
- O enredo policial da trama é extremamente raso e completamente perceptível nos minutos iniciais.
- Os personagens secundários poderiam ser melhor apresentados, porém são apenas apêndices de Bullock.