Se alguém perguntasse que local pode tranquilamente ser o campeão em lendas urbanas perturbadoras e que abalam o psicológico, sem dúvida alguma seria o Japão. O insular país asiático, em termos de lendas e mitos consegue prometer nada e entregar tudo, fazendo qualquer celebração de Halloween ou do Festival de Obon ter uma identidade própria. E dentro de histórias de mulheres que surgem em banheiros, na neve ou no meio da rua e de florestas destinadas ao suicídio, existe um túnel que desde o seu primeiro dia de construção estava fadado a ser questionado pelo povo japonês. Vamos então diretamente para a cidade de Kyoto, sede da Nintendo e uma das principais cidades nipônicas para conhecer esta lenda. A única coisa que pedimos é para que não o atravesse a noite. Mas se você tiver coragem para isso, siga em frente e conheça a história do Túnel Kiyotaki.
Sem direitos trabalhistas, o que existia era a escravidão.
Tudo começa ainda na década de 20 do século XX, quando o Japão ainda era um império em que o imperador mandava e desmandava. Em 1927, houve a necessidade de ultrapassar o montanhoso relevo japonês para que a ferrovia Atagoyama segue o seu fluxo, e por isso iniciou-se as obras do Túnel Kiyotaki. A questão é que os trabalhadores eram praticamente escravos. Esqueça contratos de trabalho onde você pode conversar com o seu chefe, na construção do Túnel Kiyotaki não havia convenção ou acordo coletivo. Os trabalhadores, em sua grande parte, trabalhavam como se fossem escravos, mesmo que a escravidão já tivesse sido abolida do Japão séculos atrás. Muito se deve ao “jeitinho” de burlar as regras para trazer condições tenebrosas a força de trabalho em vez da perda do lucro. Infelizmente, isso deixou sequelas.

Nem todos os trabalhadores que entraram para a construção saíram com vida. Conta-se que muitos morreram ou se suicidaram e foram enterrados nas proximidades. Até pelo fato de que se nem direitos possuíam, havia a necessidade de contratar um funeral digno para eles? É claro que isso estava fora de cogitação. Em torno de um ano, incontável foram os números de trabalhadores mortos, mas em 1928 o Túnel Kiyotaki finalmente estava pronto, e agora podia ser utilizado. No entanto, devido à morte de diversos trabalhadores por sua construção, essas almas errantes ficariam ali pertinho, assombrando o lugar. Como não tiveram paz no pós-vida, espíritos rancorosos ou que simplesmente não souberam atravessar são responsáveis por acidentes daqueles que passam pelo túnel, que não é mais de uma ferrovia, especialmente à noite, onde a atividade parece aumentar.
As lendas dizem que aqueles que morreram estão ali.
Contudo, o Túnel Kiyotaki parece ter uma carga própria especialmente quando a sua construção. Ocorre que em termos de diâmetro, o túnel tem aproximadamente 444 metros de extensão. Isso não seria nada para um leigo ocidental, porém faz qualquer japonês palpitar quando escuta essa conjunção de números. Isso se deve ao fato de que o número 4 nas lendas do Japão não tem prestígio algum no Oriente, sendo cercado de simbologias negativas. O fatídico número se lê como algo parecido como “shi”, que também pode ser usado para a palavra “morte”. Por este motivo, o povo japonês tem uma precedência em não curtir o número 4 e todos aqueles que o usam. Logo, um túnel de 444 metros de extensão é a repetição tríplice do mesmo número problemático.
Aliás, essa repetição por si só também é problemática, e não envolve somente o Japão. Coisas repetidas em número de três normalmente envolvem mágica ritualística ou aparecimento de criaturas das trevas. Não é incomum que rituais peçam que seja dito, falado ou praticado ações três vezes repetidas para que algo aconteça. No Ocidente, cortes e arranhões ou batidas em casas em som de três podem representar a aparição de figuras demoníacas também. Então, já está bastante óbvio que o Túnel Kiyotaki tem uma aura bastante especial de ser visitado, ainda mais que, assim como a Floresta de Aokigahara, é um ponto para aqueles que querem retirar a própria vida. Por isso tudo, o povo japonês se previne em passar pelo túnel especialmente no período da noite, já que acidentes parecem ser comuns naquela região nessa hora da noite.
Quem escolheu o exato número de 444 tinha outras intenções.
Outra superstição dentro do Túnel Kiyotaki é que sua sinalização muda, mesmo durante o dia e especialmente perto das festividades de agosto, período em que os japoneses acreditam que os espíritos saem do mundo dos mortos para visitar os vivos. Então, se acaso tenha o interesse de fazer um episódio de Caçadores de Fantasmas, o melhor momento para visitar o túnel é neste, em agosto. Claro que existem superstições e os mais céticos podem simplesmente duvidar de toda a história por trás da criação do Túnel Kiyotaki. Entretanto, como até mesmo o povo japonês tem receio em passar por aquele lugar, não seremos nós do Guariento Portal que vamos desacreditar todo um imaginário popular. Então, se passar por Kyoto, e tiver interesse em algo mais sobrenatural o Túnel Kiyotaki estará lá, te esperando em sua plena extensão de 444 metros.