CORUJÕES… VOCÊS ESTÃO PREPARADOS PARA ESSA NOITE DE HALLOWEEN?
Talk Shows fazem parte da vida da televisão desde que ela começou no preto e branco. Da mesma forma que no gênero horror, volta e meia o estilo found footage aparece e reaparece como uma tendência. Unindo essas duas tendências, o aclamado Entrevista com o Demônio, de 2023, é uma curiosa engrenagem movida pela década de 70 do século XX. Com a máxima de que vale tudo pela audiência, um apresentador em franca decadência abre seu programa, no Halloween, para entrevistar ninguém menos do que o próprio Diabo, ou pelo menos um de seus seguidores, no corpo de uma jovem adorável, ou nem tanto. Resta saber se o Jô Soares dos Estados Unidos conseguiu seus minutos de fama e glória, com direito a pactos sinistros ou se o filme acabando subestimando a si mesmo, ultrapassando até os limites de uma lenda urbana como outra qualquer.
A DÉCADA DE 70 ESTÁ PRESENTE NOS MENORES DETALHES:
Primeiramente, Entrevista com o Demônio, tem em seu principal aspecto positivo seus requisitos técnicos. Ou seja, a produção e sua trilha sonora. Filmado no formato 4:3, o padrão dos televisores antigos, assim como em tons granulados, tudo remete a década de 70. Época movida pelo Choque do Petróleo e pelo interesse com o ocultismo e o sobrenatural na sociedade americana naquela época. Aliás, o filme é senão uma representação daquela época com maestria. A trilha sonora segue no mesmo encalço, com uma banda de coadjuvante e mesmo na introdução, onde se apresenta uma espécie de documentário sobre a vida do protagonista. O espectador já consegue imergir em uma atmosfera de que estamos realmente em um talk show, com todo o seu padrão de entrevistas e comerciais. É impossível, pelo menos no Brasil não lembrar de expoentes desse tipo de programa como o de Silvio Santos.
Pois bem, o nosso Senor Abravanel dos Estados Unidos também é um ponto de destaque em Entrevista com o Demônio. Na frente do programa Night Owls, traduzido como Corujões no Brasil, Jack Delroy (David Dastmalchian) busca a fama e o sucesso. Envolvido com a perda drástica de sua esposa e abraçado, pelas más línguas, em um culto desconhecido, Jack busca na semana da audiência ultrapassar todos os seus concorrentes. E para isso, trás a história da jovem Lilly (Ingrid Torelli), que foi resgatado de um culto demoníaco que adorava Abraxas, uma entidade igual a Pazuzu, de O Exorcista (1973) e Asmodeus de O Exorcista do Papa (2023). Ou seja, é um demônio. A crescente do programa é constante, e mesmo sendo incrédulo, Jack consegue guiar de maneira satisfatória a jornada pelo programa que nunca foi ao ar, diferente de Ghostwatch (1992).
HÁ UMA CRESCENTE NO HALLOWEEN, LEVADA PELO APRESENTADOR IMORAL:
Aliás, esse estilo de produção ajuda na direção dos irmãos Cameron e Colin Cairnes. Que como dito, tem em seus aspectos técnicos seu maior ponto positivo. Não por menos, a cadência do programa, e por consequência de Entrevista com o Demônio também é satisfatoria. Em cada comercial, vemos as reais intenções dos personagens, suas discussões que simplesmente desaparecem por um sorriso na câmera quando ela está ligada. Mesmo que discordem completamente dos contornos do programa ou busquem apenas números. O uso de toda a imagética setecentista é permeada sem cortes abruptos, que nesse caso criam uma constância no filme. Não é uma inovação, afinal, temos a possessão já desenfreada em longas como O Exorcismo de Emily Rose (2005) e o estilo found footage de A Bruxa de Blair (1999). Porém, a união desses dois mundos é gratificante, mesmo que tropece e tenha suas quedas de sinal.
E são esses tropeços que sem dúvida fazem de Entrevista com o Demônio ser superestimado. Pelo menos se comparado com outras películas como Abigail (2024), que abraça o grotesco e ri de si mesmo. Ou então de A Morte do Demônio: A Ascenção (2023) e O Mal que Nos Habita (2023), ambos causadores de medo e asco. O principal pecado desse filme é de se achar mais inteligente do que o próprio espectador. Ao ponto de contar, mastigar e desossar todos os acontecimentos nos mínimos detalhes. Esse não é um filme de Christopher Nolan, e sequer tem a necessidade de explicar tudo que mostra. Tudo isso inclusive se intensifica no seu terceiro ato, o ápice da tragédia de Jack Deroy. Há uma intensificação onírica que não faz sentido e que, na dose de explicar só faz com que o filme perca o seu brilho completo.
O TERCEIRO ATO É SIMPLESMENTE… PRA QUÊ?
É justamente neste terceiro ato que Entrevista com o Demônio degringola completamente, e perde parte de seus adjetivos positivos. A possessão e a demonstração dos poderes da possuída é Formulaica, e embora abrace o gore e a violência, não causa à devida imersão que se esperava na progressão. Não que seja ruim, porém, o índice da expectativa criada durante toda a narrativa acaba não sendo compensada pelo seu final. Isso se deve realmente ao roteiro que, quando necessário o clímax de seu conteúdo, deixou a desejar. Um pequeno decréscimo na qualidade também se deve ao efeito especial. Enquanto as mutilações práticas são bem produzidas, a aparição da entidade perde completamente o efeito de assustar. Afinal, essa era a principal ideia não só do programa, como de Entrevista com o Demônio. E poderia alcançar, desde que melhores escolhas em seu terceiro ato.
No fim das contas, Entrevista com o Demônio tem seus méritos infernais. Especialmente em sua estética e todos os seus aspectos técnicos. Trazendo uma ara da década de setenta dos programas de auditório. O protagonista, a antagonista e todo o elenco de apoio é coeso e cria uma cadência interessante de argumentos. Acontece que o roteiro e a direção acabam elevando a expectativa do filme, para que o terceiro ato seja completamente desconexo. De outra forma, é um choque na ponta do dedo do espectador. E isso é terrível, pois deixa aquele sensação de quem com um gosto de amargor. Como película cinematográfica, Entrevista com o Demônio tem seus acertos e sem dúvida deve ser assistido para os fãs do gênero. Porém, longe de ser uma obra prima do gênero. Há títulos melhores com essa temática, e ainda mais audaciosos disponíveis no mercado.
NA NETFLIX OU NO PRIME VÍDEO, TALK SHOW TAMBÉM PODE SER DEMONÍACO:
Entrevista com o Demônio foi originalmente lançado em solo estadunidense em 2023. Porém, nas terras brasileiras, só chegou em 2024. Primeiramente nos cinemas pela Diamond Films, e depois através do streaming Netflix. Porém, se acaso o espectador não tenha acesso a esse serviço, com toda certeza tem ao melhor do cinema através do Prime Vídeo, parceira do Guariento Portal. Onde o terror sem dúvida alguma, pode ser alcançado de diversas formas. Além do clássico O Exorcista, o de 1973, o gore também tem seu lugar a frente das câmeras com Jogos Mortais X (2023), e o ótimo Hellraiser (2022), uma revitalização do clássico que apresentou Pinhead pela primeira vez em 1987. Opções não faltam. Claro que, a única questão é observar a classificação indicativas desses filmes no Brasil. Feito isso, é só se divertir com o melhor do cinema. Depois é claro de fazer vários sinais da cruz.
Números
Entrevista com o Demônio (2023)
Mesmo depois de ter perdido sua esposa, a TV parece um vício. Em busca por audiência e de fazer seu nome entre os apresentadores, vale tudo. ASté mesmo dar palco para uma entidade demoníaca na noite de Halloween. Essa é a deixa do superestimado Entrevista com o Demônio (2023), bem produzido mas que se perde em sua narrativa.
PRÓS
- Tecnicamente, o filme é um verdadeiro expoente da década de 70 do século XX. Da maquiagem até toda a sua produção.
- Imersão consistente pela trilha sonora e pela proposta found footage. Logo no início, já é visível que estamos vendo um verdadeiro talk show.
- O carisma do protagonista e a estranheza da antagonista geram uma dualidade interessante que guia a narrativa com seus personagens secundários.
- A direção consegue capturar a essência do que é um programa de documentário, e sabe usar a estética ao seu favor, sem cortes poluídos e uma boa dinâmica.
CONTRAS
- A expectativa gerada pelos primeiros atos do longa não se concretizam em seu trágico final, que simplesmente usa de sonhos e quebra completamente o enredo.
- O roteiro em grande parte, é consistente, mas se perde no terceiro ato, no qual se aparenta ser um outro filme completamente diferente.
- Embora com o bom uso de efeitos práticos, os efeitos ditos especiais são estranhos e não soam com a devida realidade de tudo que se mostrava.