Indiana Jones é uma franquia de filmes amada pelo público. Isso não há dúvida alguma! Tanto é que temos um Revisitando o Passado somente dele. Desde o lançamento de seu primeiro longa, em 1981, Os Caçadores da Arca Perdida, a produção que mistura George Lucas e Steven Spielberg conseguiu trazer ação e aventura em uma sessão pipoca que agrada aos gregos e troianos. Bem, mais ou menos. Acontece que alguns “pequenos” problemas geraram imbróglios para a produção e lançamento do segundo filme. Indiana Jones e o Templo da Perdição, de 1984, tem uma atmosfera muito mais sombria que seu antecessor. Se passando na Índia, seria normal que o filme fosse filmado no país correto? Porém, como se virar quando o país não aceita filmar seu querido longa? Então, pegue suas Pedras de Sankara e vamos louvar a Kali em mais uma Curiosidade do Guariento Portal.
Pois bem, para quem não conhece a história de Indiana Jones e o Templo da Perdição, vale o conselho, veja o filme, é bem melhor que A Caveira de Cristal (2008). Porém, para situar os leitores, saiba que essa é outra aventura do arqueólogo interpretado por Harrison Ford. Basicamente, Indiana Jones se encontra em uma região da Índia onde crianças estão sendo sequestradas, assim como relíquias poderosas, as Pedras de Sankara. Esse sequestro foi feito por um grupo de adoradores de Kali, uma deusa hindu que de fato existe nesta mitologia, mas que aqui no longa chega a envolver sacrifícios humanos pela fraternidade dos Tuges – que historicamente também existiu. Então, cabe ao homem do chicote salvar o dia ao lado de seus amigos. Por isso, com essa imensa referência na cultura hindu, normal seria que o filme tivesse cenas filmadas na Índia.
Seria o roteiro de O Templo da Perdição racista e preconceituoso?
Entretanto, a Índia, antes de permitir a produção em seu território, solicitou uma cópia do roteiro para a equipe de produção. Procedimento padrão, como você também vê no Irã em Argo (2012). A questão é que, os censores do país destacaram que o roteiro era “racista” e “preconceituoso”, ordenando alterações e a dádiva de ter a primazia com o final de Indiana Jones e o Templo da Perdição. Essas alterações sugeridas foram tantas que ao invés do Norte da Índia, a equipe teve de se mudar para a cidade de Kandi, no Sri Lanka, um pequeno país insular no Oceano Índico. Mesmo assim, o filme repercutiu bastante na Índia em seu lançamento. E, convenhamos, com uma certa razão. Afinal, não foi a melhor forma de tratar a cultura indiana. Se fosse um filme no Brasil, mostraria violência, favelas e o Carnaval.
Tanto é que Indiana Jones e o Templo da Perdição foi censurado e banido temporariamente na Índia. Basicamente, eram dois grandes pontos problemáticos dentro do roteiro de Indiana Jones; o uso bastante impreciso e incorreto da deusa Kali como uma entidade parecida com o Demônio cristão – quase um Diablo Hindu – e a culinária. Para quem não sabe, Kali é venerada na Índia por ter sido ela a responsável pela derrota de um terrível asura, Raktabija. Segundo a mitologia hindu, Durga estava perdendo a batalha quando Kali surge, em sua pele azulada, língua de fora e crânios formando um colar. Lambendo cada gota de sangue demoníaco, ela consegue frear o ímpeto de Raktabija e derrotar a criatura. Desta forma, ao se apresentar como uma entidade que necessita de sacrifícios humanos em O Templo da Perdição, Kali passa a ser desvirtuada para uma entidade plenamente maléfica, algo que não ocorre no hinduísmo.
O banquete era uma piada, mas se transformou em algo de mal gosto.
Quanto à culinária, Indiana Jones e o Templo da Perdição tem uma das cenas mais desconcertantes para um bom paladar no famoso banquete do Marajá de Pankot. Ali, são servidos iguarias como cérebros de macacos refrigerados, sopa de olhos e uma serpente assada com filhotes inteiros vivos. Claro que isso foi um soco no na cultura indiana, uma vez que tais iguarias não são servidas na Índia. Aliás, uma coisa que a Índia é conhecida é pelo fervor e respeito aos animais – em especial as vacas – e pela qualidade de seus temperos, as massalas. Então, mostrar uma cultura através de iguarias erradas só contribuiu com estereótipos opressivos. Assim, com tudo isso, é de se esperar que a Índia censure o filme em seu lançamento, ao ponto de que o proibisse. Essa proibição porém não está mais vigente.
Porém, se a Índia foi o grande problema em Indiana Jones e o Templo da Perdição, a China também deu sua cota de preocupação. O primeiro ato ocorre em Xangai, onde Indiana Jones busca o olho de Shangri-Lá. Porém, o roteiro original colocava Indiana Jones andando de moto na Muralha da China – algo que pode ser visto em Lara Croft: Tomb Raider – A Origem da Vida (2003). No entanto, os chineses também acharam ofensivo a forma como trataram sua etnia, mostrando a salvação pelas mãos de Indiana Jones, um homem branco, europeu e ocidental. Assim, a China vetou qualquer tipo de filmagem perto de sua Grande Muralha. Porém, ainda aceitou o lançamento do filme em 1984 em seus cinemas. Para quem achou que uma das franquias mais amadas do mundo não teve problema… Mas nesse caso, nem o chicote de Indy o salvou.