Não existe uma palavra que gere mais torções de narizes e caras emburradas do que a Política. Falar sobre isso é capaz de separar famílias e amigos, com alguns sendo mandados para a Venezuela e outros para o Afeganistão. No entanto, não estamos jogando Rebel Inc. ou Workers & Resources Soviet Republic, mas estamos falando da vida real. Platão, aquele grego antigo que você viu em filosofia, disse em sua República que o ser humano é político. É justamente pensando nisso, em acalmar e trazer um espaço mais aconchegante é que o Guariento Portal trás 4 Jogos que colocam o jogador na pele de verdadeiros formadores de política. Imperadores, governadores e reis. Jogos como Civilization, Humankind, Victoria e Realpolitik mostram que esse assunto é muito mais denso que uma simples disputa ideológica. Curiosos? Então pegue sua cópia de O Príncipe de Maquiavel e veja jogos para quem curte falar de Política.
Atenção: Como já é de praxe aqui no Guariento Portal, a intenção deste Top 4 não é enviar ninguém para a Arábia Saudita ou para Cuba. No entanto, temos um humor ácido como já pode ter sido visto por aqueles que acompanham este site. E claro, notaram nas primeiras frases desta lista. A intenção não é ofender, mas sim criar um ambiente agradável que possa unir assuntos diversos com o mundo dos jogos. Neste caso, é mostrar como é difícil falar de Política ao transformar em algo tão parco quanto a briga mesquinha entre direita e esquerda. Assim, nada mais justo do que transformar o nobre jogador ou jogadora nos verdadeiros formadores de políticas públicas. E isso é feito nesses quatro jogos. Ao final, a economia a gente não vê depois, mas vê agora com todas as outras variáveis com o primo entre os pares; Civilization.
1º – Civilization VI. Produzido pela Firaxis Games.
O Papa dos jogos de estratégia em tempo real. Esse é Civilization, a franquia iniciada em 1991 e que até hoje tem o nome de seu criador, o canadense Sid Meier. Porém aqui o Guariento Portal vai falar de sua sexta versão, lançada em 2016 pela 2K e desenvolvida pela Firaxis Games. Como de costume, o jogador é colocado na pele do líder de uma das mais variadas nações disponíveis e deve fazer seu nome no panteão da história. Desenvolva, construa, guerreie e comercialize. Essas são apenas algumas das necessidades que seu nascente Estado deve cuidar para que no decorrer das Eras não sucumba ao poder de seus vizinhos – ainda mais se você for vizinho da Índia de Gandhi. E, no melhor estilo de que ninguém é igual – como sua mãe falava contigo quando era criança – as nações disponíveis tem suas especificidades.
Portugal de Dom João e o Reino Unido da Rainha Vitória amam o mar e o comércio, enquanto a Arábia de Saladino e a Espanha de Filipe II têm o foco na religião. Outros, como a Suméria de Gilgamesh, adoram um conflito e estarão dispostos a tudo pela Guerra da Conquista como se fossem o Rei Aegon, Conquistador de Westeros. Com essas diferenças, é claro que mais cedo ou mais tarde, o jogador terá que tomar atitudes que poderão levar ao descontentamento de seus vizinhos. E quem sabe transformá-lo em aliados valiosos. Ao mesmo tempo, deve desenvolver as tecnologias de sua civilização, sejam elas civis ou militares. O nome de sua nação deve reverberar ao trazer glória, poder, turistas e muitas Maravilhas que darão inveja ao seu adversário. Afinal, Política não é somente pela Arte da Guerra.

Sua Civilização será guiada até o fim dos tempos.
E é aqui que os leitores de Sun Tzu e de Maquiavel se deliciam, pois Civilization VI trás a Política de maneira descomplicada é verdade, mas em suas diversas posições. Um bom contrato de comércio pode fazer com que uma nação ganhe apreço pela sua. Ou ao não aceitar uma guerra, isso pode levar com que você, o líder, seja visto com bons olhos. O desenvolvimento interno também fará com que nações fiquem receosas em tentar qualquer gracinha com você. Afinal, se você possui um arsenal nuclear, pensarão quatro vezes antes de te atacar. Esse é o mesmo poder de persuasão que Estados Unidos e Rússia tem no mundo real, e é transportado de maneira apropriada para dentro de Civilization. Embora essa Política prática – que os alemães chamam de Realpolitik – não é a única forma de prestar tais serviços.
Possuindo ainda duas expansões (Rise and Fall e Gathering Storm) e disponível nas plataformas de Sony, Microsoft, Nintendo Switch e PC, Civilization VI ainda trás aspectos contemporâneos como o caso das mudanças climáticas – cada vez mais evidentes, lamento se você é negacionista desse assunto. Assim como mostra que o mundo gira, e não é plano, com Eras de ascensão e queda de Impérios. Tudo isso traz ainda mais realidade ao jogo que, como dito, é o mais “tranquilo” dos quatro a serem apresentados. Tudo pelo ótimo trabalho de seus desenvolvedores em criar algo que, embora complexo e cheio de conteúdo, não é difícil de entender. O que contraditoriamente acaba o afastando do mundo real, sem deixar seu legado é claro como o primo entre os pares no quesito jogo de estratégia política. Não por menos, Civilization é uma clara referência ao próximo jogo desta Lista, Humankind.
2º – Humankind. Produzido pela Amplitude Studios.
Se, de um lado, Civilization se foca em escrever a história com “certos parâmetros” estabelecidos, afinal, sua Civilização tem um foco todo especial, Humankind veio para mostrar que há muito a moer com esta narrativa. Aqui, no jogo da Amplitude Studios e publicado pela Sega – sim, a do ouriço Sonic – o jogador é colocado simplesmente como o redefinidor de toda a história da humanidade. É possível colocar norte-americanos como os construtores originais das Grandes Pirâmides ou brasileiros como os precursores da Muralha da China. O aspecto cultural em Humankind ganha ainda mais força. Sendo um jogo de estratégia em tempo real 4K, é possível perceber que Civilization foi uma mãe, e tudo que é visto como base do jogo da 2K também está aqui. No fim das contas, e no decorrer das Eras, o jogador deve fazer sua civilização florescer.
Mesmo que para isso seja necessária a Queda e a Conquista de outros Impérios em Humankind. Com este aspecto cultural que forjam novas alianças e toma uma importância que antes não era vista, as possibilidades se abrem ainda mais ao jogador. O que o jogo faz questão de colocar em seu slogan, redefinir a história da humanidade. Contudo, pegando todos os aspectos políticos, Humankind pode sim ser uma inovação por trazer mais forças em outras áreas deixadas para trás, porém, isso deveria ser feito com maior cuidado e calma. A jogabilidade, no fim das contas, não é tão pacífica quanto seu antecessor espiritual por assim dizer, exigindo mais da mentalidade do jogador. O que acaba o aproximando da realidade. Ao mesmo tempo que deve se desenvolver culturalmente, o jogador deve tomar cuidado com suas fronteiras e com o comércio.

Sua sociedade começa do zero, e você reescreve toda a humanidade.
A Inteligência Artificial base de Humankind é ainda mais complexa e deixa margens para que o jogo seja realmente difícil, criando um efeito borboleta em grande escala. Afinal, aquele momento em que você poderia ter dominado uma Capital e teve piedade – ou não conquistou os pontos necessários – pode ser a centelha para que uma incursão seja posta contra você. E assim, sua civilização é varrida de toda a existência. Com o decorrer das Eras, o jogador terá a oportunidade de modernizar suas preferências, se tornando o que quiser. De um sacerdote religioso que confia no poder invisível até mesmo um general que as armas são seus melhores remédios. Tudo isso é claro em questão de séculos, enquanto o tabuleiro de xadrez mundial anda com suas próprias pernas. Há uma espécie de liberdade presente em Humankind que não é vista em outros locais.
E isso acaba sendo uma faca de dois gumes. Afinal, reescrever a história é dar ao jogador poderes praticamente ilimitados para criar a nação que bem entender, com os aspectos que melhor preferir, com foco no que quiser – por enquanto somente no PC. Porém, no mundo real, isso não acontece. Existem nações que naturalmente terão dificuldades com alguns assuntos, e não dá para em um “reset” alterar o foco. Um país com uma postura militarista como o Irã e a Sérvia por exemplo dificilmente alterarão este ponto de vista histórico. O mesmo acontece nas relações exteriores tendo o caso do Brasil. A política de apaziguamento, mais conhecida como a política de “ser amigo de todo mundo” pode ter sofrido sérios abalos, mas ainda se mantém pelo histórico brasileiro de sua neutralidade em grandes conflitos. Essas dificuldades históricas podem ser vistas por exemplo no próximo jogo, Victoria III.
3º – Victoria III. Produzido pela Paradox Interactive.
Falar da Paradox Interactive é o mesmo que criar uma lista só com jogos da desenvolvedora sueca que abordam temas ousados. E com conteúdos que dão nó na cabeça e no cabelo de todo mundo. De Crusader Kings III até Europa Universallis IV, seus desenvolvedores já estão capacitados o suficiente para demonstrar o quão complicado é manter nos eixos uma nação. Esse é o caso de Victoria III, sucessor direto de Victoria II – e suas duas expansões A House Divided e Heart of Darkness. Se, por um lado, Civilization e Humankind detém, de certa forma o seu foco nas questões externas, aqui o jogador terá que ter sabedoria no desenvolvimento e industrialização de sua nação. Não por menos, a criação de indústria, o desenvolvimento de ferrovias e até mesmo as migrações serão variáveis que o jogador deverá liderar e compreender com cautela.
Claro que, se passando no período da Era Vitoriana e da Partilha da África e da Ásia (de 1836 até 1936), os assuntos externos também serão de extrema importância. Mas até mesmo estes vão estar coordenados a todas as suas estruturas internas. Para se desenvolver, será necessário ter acesso a ferro e a carvão para que as ferrovias sejam produzidas, e isso fará a corrida do jogador até as inexploradas colônias da África e da Ásia. A depender de quão bem politicamente e economicamente sua nação estiver, prepare-se para um fluxo migratório que poderá alterar significativamente o humor de sua população. E até mesmo pior, fomentar uma revolta civil contra algo que não os agrada. A política vista em Victoria III se aproxima muito do mundo real por este aspecto; nada é feito pensando apenas no externo, mas tendo o interno como preceito fundamental.

Um dos mais importantes períodos da história está aqui.
Aos poucos, com a tecnologia progredindo e com as conquistas de outros territórios em franca expansão, o jogador deverá também embarcar não somente nisso como no cenário internacional. No entanto, uma questão que pode ter virado os olhares para alguns jogadores que conhecem esse tipo de jogo é que o foco de Victoria III foi alterado de seus antecessores. Justamente por este terceiro capítulo ter colocado na liderança questões econômicas internas do que anteriormente, onde havia certa igualdade com o cenário internacional. Ademais, este também não é um jogo de estratégia de turnos, mostrando que não é necessário seguir à risca um mote ou estilo para demonstrar as inúmeras variáveis que um presidente, rei e até ditador tem em conquistar – ou dominar – seu povo, suas lideranças e as instituições. São cem anos em que o plano de fundo está escrito, mas o jogador tem as rédeas de sua nação.
Aqui em Victoria III o jogador poderá usar a Política como bem entender. Se achar melhor se firmar com as Grandes Potências, ou quem sabe almejar esse status destruindo o status quo. Quem sabe ainda, se familiarizar com alguma contenta e, se mostrando relevante, tentar resolvê-la por meio diplomáticos, porém sempre disposto a entrar no meio armado. Com inúmeras variáveis, o jogo – exclusivo do PC – tem a necessidade de horas e mais horas para entender todas as suas mecânicas e a complexidade de qualquer ato. Que demorará para ser desfeito ou criar suas consequências, sejam elas benéficas ou maléficas. Agora, ainda assim o jogo chega a ser mais amigável e plausível do que nosso último elemento dessa lista, que embora pregando a praticidade sem viés nas relações internacionais, mostra de maneira extrema o quão difícil e intrincado é esse jogo da discórdia que nem Éris pensou alguma vez.
4º – Realpolitiks. Produzido pela Jujubee S.A
Realpolitiks sem sombra de dúvida é aquele jogo que, dentre os outros três apresentados deve ser o menos conhecido de Civilization ou Humankind. Porém, não se engane meu caro jogador ou jogadora. Pois aqui temos de fato, quase que como uma verdade nua e crua do quão difícil é entender de Política. Especialmente quando você é o líder ou uma pessoa de renome que recai na questão de promover políticas públicas. Com o apoio do mapa-múndi no melhor estilo War, o jogador é colocado para analisar todas, sim, “todas” as variáveis possíveis. Desde eleições, conflitos internos, economia, saúde, educação e segurança até as questões internacionais. Tudo que um Presidente da República deve conhecer, saber e opinar estão presentes, e exigirão tempo mais do que necessário. Nenhuma resposta é correta ou errada, mas com toda certeza ela ocasionará algum efeito colateral.
E por isso mesmo cabe a você, como nobre jogador, prever antes de acontecer e colocar em cheque toda a sua estrutura de poder. Graficamente sendo o mais simples dos quatro jogos apresentados, sem dúvidas é o mais difícil, porém o mais paradoxal. A Inteligência Artificial do jogo coloca o jogador sempre a prova com as suas próprias concepções. Melhorar os índices educacionais pode trazer uma perda de poder ao líder – vulgo jogador – e aumentar as possibilidades de revoltas populares. De forma análoga, uma nação ditatorial pode vender determinado insumo mais barato do que aquele paraíso democrático que é seu amigo. A Realpolitiks como forma de interação entre nações é curta, grossa e prática. O envolvimento não deve ser por inspiração ideológica, mas sim em um tabuleiro de praticidade e objetividade, é melhor para o meu país e ponto.

O suprassumo da Arte da Política, e de quão difícil ela é.
Ainda mantendo esse contexto paradoxal, Realpolitiks é ao mesmo tempo o mais fidedigno quanto também o mais irreal jogo de estratégia apresentado nesta lista. Explicando melhor, mesmo com todas as informações e problemáticas que a nação – dentre as mais de 100 do mundo inteiro – escolhida possa ter, não há problemas em obter uma invasão árabe na Península Ibérica ou uma Reconquista Russa do Leste Europeu. Obviamente, tudo isso partindo do cerne do pensamento que dá título ao jogo. Entretanto, chegar nisso é a prova viva de que o jogador é um exímio enxadrista do nível Batalhão de Operações Especiais. Uma vez que, se tais ocorrências no mundo real são praticamente impossíveis, elas podem ocorrer em Realpolitiks. E o jogador pode ser tornar a caça de alguma nação que você nunca pensou que seria sua inimiga mortal. Mas aqui ela poderá ser.
No fim das contas, Realpolitiks é o mais acessível dos quatro jogos apresentados nesta lista. Afinal, além de todos os consoles de Sony, de Microsoft, Nintendo Switch e o PC, o jogo também tem versões para dispositivos mobiles. O jogo conta ainda com uma versão mais atual, lançada em 2021, porém é este predecessor quem coloca todos os pontos necessários para definir o quão complexo, custoso e dificultoso é estar na pele de alguém que detém o poder central de uma nação. Não é fácil fazer a vez de Têmis, a deusa da Justiça e colocar em cada lado da balança o que de fato é o melhor. A depender do que você acredita, nem tudo que poderia ser necessariamente moralista é o melhor para a sua nação. E é justamente mostrando tudo isso que Civilization, Humankind, Victoria III e Realpolitiks devem ser mencionados. E foram realmente.
No fim de tudo, você estará jogando, falando e amando política.
Voltando ao cerne de tudo que foi apresentado nesta Lista do Guariento Portal, é possível perceber que falar de Política, ou melhor, entendê-la é algo que não é feito em suas frases. Nem mesmo em uma lista com quatro jogos. Estes podem ajudar cada um à sua maneira, mas é uma forma de demonstrar que até mesmo no mundo do entretenimento eletrônico existe sim, e a política é fortemente enraizada. Seja a criação do jogo, sua concepção ou a história e toda a narrativa que ele vem a contar para seu público. Tudo é política, afinal, vivemos em sociedade e somos seres humanos, e isso é visto com Civilization, Humankind, Victoria III e Realpolitiks. O que pode ser tirado de todos esses jogos? Bem, Política não é pensada da noite para o dia, assim como todas as ações que derivam dela.
A complexidade com que apenas uma opinião, ação ou omissão pode reverberar em todas as esferas possíveis pode não ser apresentada em sua essência nestes jogos, mas em parte são como escolas de interpretação. Civilization VI e Humankind trazem um comportamento externo, em que as relações externas devem ser muito bem pesadas, enquanto o foco de Victoria III destaca todo o contexto interno de industrialização – assunto que poderia muito bem ser melhor abordado em nações da América Latina, como o Brasil. Por fim, a Realpolitiks trás a todo o momento na cara do jogador que a Política é uma interpretação objetiva, que devaneios ideológicos devem ser deixados para trás. É claro, é uma forma de interpretação, mas lhe fará mais cedo ou mais tarde, pensar e começar a se questionar. Assim, o jogo cumprirá a sua função, e você meu nobre jogador ou jogadora estará pensando na Política.