Na década de 80 do século passado, o gênero horror já tinha seus principais expoentes. Freddy Krueger, de A Hora do Pesadelo, e Jason Voorhees, de Sexta Feira 13 arrebatavam uma multidão de fãs. Cada um ao seu estilo. Seja pelo tom irônico de Freddy quanto a ferocidade de Jason, ambos trouxeram o gênero slasher para um período de prosperidade. Restava então trazer um terror mais sobrenatural e caótico, mesmo que Freddy cumprisse seu papel como mestre dos sonhos. É em parte dessa lógica que surge Hellraiser: Renascido do Inferno, baseado em uma novela do escritor Clive Barker em 1987. Misturando uma atmosfera extremamente opressiva com uma história que em nenhum momento apela para o slasher. Porém, de extrema violência e de efeitos práticos extremamente caprichados, o longa logo se tornou um clássico do gênero de horror. Resta saber se toda essa viagem é recheado de dor, ou de prazer.
Um dos melhores exemplos de que nem todo efeito especial é melhor que efeito prático:
Primeiramente, Hellraiser: Renascido do Inferno apresenta um dos melhores efeitos práticos já vistos para o gênero. Melhores até mesmo do que O Enigma de Outro Mundo de 1982, clássico nesse quesito. Criativo, a produção do próprio Barker se utilizou de extrema sobriedade em trazer suas criaturas e todos os desenhos do corpo humano. Para quem não conhece, Hellraiser trás ao espectador os Cenobitas, raças que para uns são anjos, para outros demônios. Exploradores dos sentidos do prazer e da dor. Baseados em desenhos e com roupas sadomasoquistas, estas criaturas arrebatam as almas de todos aqueles que desvendam os segredos da Configuração dos Lamentos, uma caixa enigmática. E este arrebatamento é feito com muitas correntes e uma dose considerável de sangue e vísceras. O longa assim não faz questão alguma de diminuir o uso de elementos chocantes, fazendo disso sua espécie de marca registrada.
Como dito, as criaturas que se apresentam tem uma configuração extremamente orgânica, e mesmo com pouco tempo de tela, se fazem presente em uma atmosfera completamente tenebrosa. Pinhead e seus exércitos de cenobitas, protagonizado por Doug Bradley tem uma imponência tão grande que sem dúvida é o ponto alto e uma das melhores coisas que Hellraiser poderia trazer para o gênero do horror. Ao seu lado, a transfiguração de Frank Cotton depois de seu aparente sumiço é ao mesmo tempo grotesca e fascinante. Sem pele, a maquiagem e os efeitos plásticos se sobressaem sobre grande parte de efeitos especiais da atualidade. Assim, é fácil dizer que Hellraiser: Renascido do Inferno impõe uma atmosfera que ao mesmo tempo fascina e enerva, sendo única. Prepare-se para uma grande quantidade de momentos profanos, vinculados ao sexo, a violência e todas estas questões, que foram tiradas do própria novela original.
Uma narrativa que segue um padrão, com uma trilha sonora que pode ser chamada de icônica:
Além de toda parte visual de seus efeitos e claro, da presença de seus vilões é possível também destacar a trilha sonora de Hellraiser. Embora não seja extremamente inspiradora, ela faz como seus congêneres. Quando os sons mais assombrosos começam, imediatamente o espectador se pega em uma zona de perigo. É claro que alguns dos efeitos especiais, visto hoje em dia, podem parecer datados em especial a dilaceração da pele, mas ainda assim, para a época e para os padrões de outrora, o longa marca o gênero com uma língua extremamente cruel e sanguinária, ao ponto de que O Albergue por exemplo, parecer um sofrimento extremamente raso para o que Pinhead e seus Cenobitas fazem para com todos que abrem a Configuração dos Lamentos. O que não fica datado de forma alguma é sua ambientação e a plasticidade de suas criaturas, com excelente uso de luz e sombras.
Indo para a narrativa de Hellraiser: Renascido do Inferno, temos algumas modificações em relação ao livro que ao qual deu origem. Frank Cotton desparece e seu irmão Larry e sua esposa Julia se mudam para a casa do então desaparecido. No entanto, o público sabe o que aconteceu. Descobrindo o segredo da caixa dos Cenobitas, Frank é enviado para uma outra dimensão numa cena caótica com correntes e carne humana para todo o lado. No entanto, é revelado aos poucos que Julia teve um caso com Frank, e depois que seu marido se corta no sótão da casa, Frank consegue retornar. É nesse momento que Kirsty, a filha de Larry busca entender toda essa lógica, desconfiando da madrasta. É interessante notar que nos primeiros momentos do longa, a família dita tradicional é tratada desta forma, enquanto Frank é um pederasta da maior categoria.
A ingenuidade de Barker pode ter ajudado em atuações ruins dos atores, assim como criações desnecessárias:
Entretanto, se é interessante observar essa dualidade entre os personagens, provando que até mesmo na tranquilidade pode reinar um resquício de malícia, como é o caso de Julia, a história não progride de maneira adequado. O então novato Clive Barker para situações de cinema foi o responsável por praticamente tudo no longa. No entanto, mesmo sendo a pessoa por trás da identidade, ainda assim a história de Hellraiser: Renascido do Inferno tem um segundo ato extremamente truncado e um terceiro que desafia alguns pontos da descrença do espectador. Certos pontos da dualidade, especialmente de Julia são convincentes, mas seus atores não o fazem de grande forma. Em verdade, a maior parte deles se apresenta de maneira estereotipada, sendo que o espectador já nota qual o final esperado para cada um dele. A criação de personagens secundários desnecessários também só aumenta e inunda uma história se a necessidade correspondente.
Entretanto, o que estraga o longa mesmo com algumas barrigas em seu segundo ato é o terceiro ato de Hellraiser: Renascido do Inferno. Com uma reviravolta ocorrida antes, Kirsty acaba fazendo um trato no melhor estilo Fausto com Pinhead. Cabia a ela demonstrar que Frank Cotton escapou dos cenobitas, e isso acaba levando-o de volta para o Inferno. No entanto, a jovem abriu a Configuração dos Lamentos, e deve ser ceifada também. Porém, de maneira mágica, ela consegue reverter o enigma, e mandar todos de volta para o Inferno, um a um, enquanto a casa que se encontrava pega fogo e é destruída. Seres interdimensionais, capazes de convocar correntes e provocar as piores dores simplesmente acabam sendo presos novamente dentro de uma caixa por uma jovem perdida na narrativa. O cliffhanger deixado também nos minutos finais para uma continuação não mantém o mesmo estilo dos pontos altos do longa.
Hellraiser: Renascido do Inferno tem sua marca. O terror sobrenatural angustiante que deveria ter existido na década de 80.
No fim das contas, Hellraiser: Renascido do Inferno mostra suas qualidades não pela narrativa, mas pela produção que ocupa, ao mostrar ao espectador uma atmosfera completamente sombria, macabra e aterradora do Inferno e dos Cenobitas. Mesclando o profano com o santo, Clive Barker trás Pinhead como um ícone do gênero de terror, que diferente de Jason e Freddy não precisa correr atrás de suas vítimas, elas é que o evocam após descobrir os segredos da Configuração dos Lamentos. O jogo de luzes e sombras, a qualidade plástica da carne e da pele e a trilha sonora são marcos e se tornaram uma referência do que viria a ser uma franquia. Além disso, a dualidade de seus personagens até pode mostrar um certo interesse do roteiro, porém sua história apresenta quedas repentinas de qualidade, com um primeiro ato incrivelmente bem feito, mas que não se sustenta.
E é basicamente aqui que se encontram as piores dores de Hellraiser: Renascido do Inferno. Primeiramente, seus atores não encarnam com atuações sóbrias, sendo estereotipados ou com poucas emoções. Até mesmo Julia por exemplo, tem seus percalços, embora não seja de toda maligna, tal como Frank, a personificação de tudo que é nefasto. Além disso, anexar personagens secundários sem nenhuma necessidade e a forma como o problema é resolvido não são o suficiente e na qualidade que se esperava de um primeiro ato tão convincente. Kirsty Cotton tinha em suas mãos a obrigação de deter Pinhead, mas não daquela forma que foi mostrada, criando algo extremamente monótono. Ainda assim, Hellraiser é louco o suficiente para criar uma atmosfera única e necessária para o gênero terror. Como tudo na vida há prazer e dor, Hellraiser: Renascido do Inferno é definitivamente a junção de ambos os sentimentos.
Veja mais no Guariento Portal se gostou deste Revisitando ao Passado. Desta vez, com um longa que levou ao público a figura de Pinhead. Clássico de 1987 Hellraiser: Renascido do Inferno. Não deixe de comentar também, pois é muito importante para o crescimento e desenvolvimento deste Portal!
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* Hellraiser: Renascido do Inferno está disponível por meio do sistema de streaming da Amazon. A título de curiosidade, o longa conseguiu ter tamanhos efeitos práticos utilizando poucos recursos. Para sua criação, foi usado cerca de um milhão de dólares. Ao ser lançado nos cinemas, Helrraiser arrecadou cerca de vinte milhões somente no mercado americano, o que obviamente levou a criação de uma extensa franquia entorno desse Universo de Clive Barker.
* Mesmo diante de toda a exposição ao gore, assim como as claras referências ao sexo e ao sadomasoquismo, Clive Barker conseguiu que o longa fosse aprovado com a tarja R-Rating. Neste caso, menores de 17 anos conseguiriam assistir ao longa desde que acompanhados por algum adulto. Para alcançar tal efeito, foi necessário o corte de cerca de 20 segundos do longa, que em teoria, seriam ainda mais sanguinários do que todo o restante.
Números
Hellraiser: Renascido do Inferno (1987)
Introduzindo o personagem Pinhead, Hellraiser: Renascido do Inferno trás um horror extremamente cruel e ousado da mente de Clive Barker.
PRÓS
- Efeitos plásticos sem igual, em especial para demonstrar a pele.
- Vilões que mostram sua presença de imediato, sem ser expositivo.
- Trilha sonora e a atmosfera bem produzida também se destacam.
- Longa intenso, com muito uso de sangue, porém que faz sentido e não é gratuito.
CONTRAS
- As atuações são antiquadas, nenhuma de destacando de imediato.
- Segundo ato apresenta lacunas com personagens secundários desnecessários.
- O clímax da batalha final é extremamente sem graça.